terça-feira, 17 de maio de 2022

Entre olhares





Pergunta-me.
As respostas estão espalhadas por aí.
No sorriso.
Embrulhadas no riso das piadas que só nós entendemos.
Hoje demos mais um passo rumo à vitória. E foram tantas as perguntas que ficaram por   fazer…
Olhas para mim como quem fura a camada mais intensa da alma e o teu olhar brilhante fala calado.
"Queres perguntar-me alguma coisa?".
As respostas estão espalhadas por aí.
No tempo. No mar. Na praia.
Na esplanada que alberga o vento que nos agita os cabelos e na bebida enchendo dois copos a meio, que partilhamos para ficarmos em sintonia.
Tenho o vício agreste – quase tão agreste como o vento – de fazer perguntas, de precisar de ter certezas, de ouvir da boca de quem amo o que completa e alegra as discrepâncias de mim.
Sempre fui difícil e o que é fácil, se não tem uma explicação lógica, deixa-me enterrada na areia, prestes a ficar presa para a eternidade.
Mas a eternidade é um horizonte tão profundo, como aquele que se divide num misto de cinzento e azul, neste dia frio, somente de temperaturas altas para nós os dois.
Talvez me tenha tornado lamechas e mole, no momento em que percebi que as perguntas que te faço não precisam de ter som. Tu adivinhas, compões as malhas de convicção que me fazem ter as tais certezas tão definidas que, no fundo, não servem para definir nada, porque os teus olhos falam e isso chega-me.
“Queres perguntar-me alguma coisa?”.
Faíscas que saltam e letras que se desenham, nas pupilas dos teus olhos. E tudo o que eu preciso, está em ti.
Hoje o som não faz sentido. As palavras e os discursos perderam o norte e eu encontrei-me na bússola que se traduz nas tuas palavras caladas e nas marés calmas e carregadas de promessas, que ondulam no teu olhar…
“Queres perguntar-me alguma coisa?”.
Ainda é Inverno mas o meu coração está quente. Há momentos e pessoas que nos aquecem por dentro.
Em gestos tão simples como mãos dadas a percorrer a avenida. Ou o caminho lado a lado, na faixa de areia que delimita a entrada para um mar revolto.
É bom ir à praia no Inverno.
É bom mudar a rotina e contrariar o que, à partida, está delineado em cada estação. É bom sentirmo-nos vivos.
E eu sinto!
Sinto tudo, quando olhas para mim e dizes em silêncio, apenas com um olhar.
"Queres perguntar-me alguma coisa?".






[Imagem retirada da Internet]



Este texto integra o meu livro:


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terça-feira, 10 de maio de 2022

Tudo ou nada





Não há nada, mas, no entanto, há tudo!

Há o aroma a café, de manhã, quando acordas. Deixa-me dizer-te que, agarrado a ele, vem o sabor do carinho, do amor e das emoções boas. É um gesto de amor fazer café para alguém.
Há o sol a entrar, quando abres a janela. Ou o barulho da chuva, num dia cinzento. Com eles, seja um ou seja outro, vem agrafada a certeza de que respiramos, de que estamos vivos. Agradecer por mais um dia devia ser, simplesmente, um hábito rotineiro.
Há a decisão complexa de escolher o que se vai vestir. E, quando se abre o guarda-roupa e se vê a diversidade, aparece a certeza de que, pelo menos nós, ainda temos por onde escolher. Há alguém, num canto qualquer, de um sítio qualquer, num mundo qualquer, mas menos risonho que o nosso, que não tem nada para vestir.

Não há nada, mas, no entanto, há tudo!

Há os sonhos que eu sonhei durante a noite e que, quando a manhã chega (enquanto bebo o café que me preparaste), tenho a benesse de conseguir passar para o papel. Não há nada melhor, nem mais gratificante, do que o poder de conseguir passar o que se sente para a eternidade. Construir memórias, edificar lembranças e provar o gosto tão doce e inexplicável do que é a escrita.
Há os transportes que temos de apanhar para o trabalho que nos espera. É cansativo, sim! Mas mais vale ter um trabalho, ganhar o próprio sustento, do que contar os tostões ao fim do mês (ainda que o façamos, por vezes). Ter a consciência tranquila e, mais uma vez agradecer, pela oportunidade que, nos dias que correm, nos caiu do céu.
Há o telefone a tocar. Saber que alguém que nos é querido ainda está e se lembra de nós. Há lá coisa melhor do que demonstrar o que se sente! Uma mensagem de alguém especial faz com que o dia seja mais fácil de suportar.
Há a magia das noites. Chegar a casa e ter alguém à nossa espera. Uma pessoa, um copo de vinho, um livro, a nossa série preferida ou o nosso animal de estimação. Solidão ou casa cheia, cada um é livre de escolher o que quiser. E seríamos todos tão mais felizes se aprendêssemos a respeitar quem é diferente…

Não há nada, mas, no entanto, há tudo!

Então, porque é que continuamos a descarregar as nossas frustrações, em tudo e em todos?
Então, porque é que nos culpamos incoerentemente, por coisas que não nos cabe a nós controlar?
Então, porque é que achamos que ainda é pouco? Porque é que não há empatia e porque é que matamos por causa disso?

Não há nada, mas, no mundo – naquele onde vivemos –, há tudo!

E é melhor aproveitar, antes que o tudo se torne nada e nada restar do tudo que somos.






[Imagem retirada da Internet]



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